segunda-feira, setembro 27, 2004

Is just You ?

De alguma forma descobri que estar sozinho eh o equivalente moderno da peste, e nao raro escuto a maldita pergunta : Is just you ?
Desde que me conheco como adulto eu escuto com certa frequencia a tal da pergunta, mas ontem eu pude observar como as pessoas reagem a alguem, digamos, sozinho.
Acordei as oito com meu flatmate se vestindo para o trabalho e fazendo o ritual diario de perguntar "E ai ?" que traduzindo em uma linguagem sincera seria "porque voce nao vai dormir em seu quarto ao inves de atravancar a sala, seu imbecil ?" e eu respondi o usual "beleza" que significa "meu quarto nao tem TV, e eh muito frio". Visto que inacreditavelmente, eu nao me sentia mais dormindo (desde que comecei a trabalhar noites, madrugo e durmo ate as duas da tarde, quando vou me preparar para o trabalho) pude perceber o Sol iluminando a paisagem de Queenstown pela vidraca de nossa sala, mais que perfeito se notarmos que pago NZ$ 100,00 por semana para ter a paisagem.
Vesti minha camisa branca, a qual nao usava ha muito tempo e ate fiz um charme para escolher o sapato (acabei pondo um tenis para parecer mais casual) e apos um copo de suco e um cigarro, decidi aproveitar o meu Domingo e tentar esquecer que as tres iria trabalhar.
Estacionei minha moto, fui ate o trabalho para checar como estavam as coisas (e serrar um cafe de graca) e descobri que novamente mandaram a salsa italiana ao inves da chinesa (a qual eu uso) - China, Asia - Italia,Europa, sera que esses imbecis nunca vao perceber a diferenca ?
Apos tomar meu Double-shot-flat-white, decidi fazer uma caminhada ao redor do centro de Queenstown, levantei-me e disse que iria "dar uma volta" quando veio a primeira "Com Quem ?" - sozinho oras, com quem meu chefe esperava ? Enfim, sai e fui sentar em uma mesa ao deck de um restaurante charmoso em frente ao lago Wakatipu, saquei meu livro, cigarros, oculos escuros e esperei pelo servico.
A garconete chegou, trazendo dois cardapios e ao por na mesa, espantou-se quando disse que era so eu - disfarcou com um sorriso sem-graca enquanto removia o cardapio e um jogo de talheres - abri a Reader's Digest e comecei a ler uma reportagem sobre encontros on-line (a reporter nao encontrou ninguem interessante, apenas alguns estranhos sujeitos que aparentemente eram muito sozinhos) e quando passei a ler sobre um artista plastico que amava a arte (aparentemente menos que heroina) e que havia, em destaque, morrido sozinho e solitario quando notei que na mesa ao lado havia um senhor de idade, sozinho tambem, sentado e olhando ao redor como uma aguia a procura da presa, talvez em uma desesperada tentativa de puxar papo com alguem - na possibilidade, enfiei a cara em minha revista para nao entrar em contato visual (eh fatal, olhou, conversou) e engoli meu chopp antes de deixar a mesa. Sem gorjetas.
Andei alguns metros e vi a agencia de viagens, pensei em checar as ofertas para o pacifico, ando louco para viajar e esse talvez seria o melhor momento para ver se conseguiria alguma coisa interessante. Entrei e fui atendido por uma simpatica funcionaria, que comecou imediatamente a checar voos e estadia no orcamento que pedi, apos quinze minutos veio a fatal pergunta "Is just you ?" - era demais para um mero ser humano - porque as pessoas nao aceitam o fato de que estou sozinho ? Talvez eu esteja em meu limbo social.
Uma pessoa sozinha deve ter algum problema grave de relacionamento, ou talvez esteja sozinha pelo fato de ser detestavel, existem inumeras razoes para se achar que alguem esta sozinho menos talvez o fato de que esta pessoa queira estar sozinha. Pessoas que acabei de conhecer usualmente perguntam da minha namorada e os rostos quando descobrem a inexistencia de uma sao dignos de serem fotografados e colocados em um painel, o meu mosaico de rostos avessos a minha suposta solidao seria um enorme outdoor em meio a Times Square, imagino essas pessoas comentando em outro canto da sala "cara estranho, sai sozinho..." enquanto tomo meu drink observando as pessoas ao redor - seria mais discreto usar flash-lights pelo corpo do que aparentar estar sozinho.
Enquanto isso, Simone, recem-chegada do Brasil e de emocionantes ferias em familia pela Bahia com direito a todos os mimos que merecem as pessoas que estavam distantes, se encontrava de volta a solidao da Nova Zelandia e se dedicou aos afazeres domesticos. Quando cheguei em casa me deparei com ela passando aspirador no terrario do Jardim da frente usando uma camisa da selecao manchada, havaianas e calca fuseau; ao entrar percebi que a casa havia sido literalmente esterilizada - a limpeza era tanta que fiquei com medo de pisar no carpete, o que algumas horas sozinha nao fazem ? Nao que ela nao tenha o habito de limpar, pelo contrario, mas os detalhes que me impressionaram.
Algumas pessoas nao lidam muito bem com o fato de estarem sozinhas e as vezes, e apenas nestes momentos, voce tera a oportunidade de conhecer alguem em profundidade como eu conheci o Eduardo, meu flatmate, que desde que chegou na NZ nao desgrudou um minuto da Simone - ate que ela resolveu ir para o Brasil. O relacionamento deles e de um tipo que eu gosto de chamar de "intensivao" -varias ligacoes por dia, encontros nos momentos vagos e se possivel, nao se desgrudar um so momento, nao eh critica, apenas eh um fato e o jeito que eles sao e gostam. Mas durante estes dias de separacao, muitas noites eu chegava do trabalho e la estava o Eduardo, na sala me esperando para contar as ultimas e bater papo e a frequencia foi muito maior que a usual. Pude observar a reacao dele a solidao, mas nesse caso nao era por opcao.
Ao chegar ao trabalho, meu chefe estava em uma acalorada discussao com a esposa ao telefone (que aparentemente nao o da a possibilidade de ficar sozinho) e a maldita garconete que odeio se encrencando com o namorado na porta - nunca fiquei tao feliz por estar sozinho, e queria ,se possivel, nem estar ali - queria estar naquela mesa ensolarada, lendo e tomando meu chopp vagarosamente, sozinho, exatamente como gostaria de estar.



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