quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Jake.


Todo vilão possui o seu parceiro - seu gêmeo malévolo, seu comparsa, seu co-autor, aquele cara que termina sua frases e com um simples olhar sabe que algo (ruim) esta prester a acontecer, que cobre as suas e que espera o mesmo de você. O meu é o Jake.
Jake é o cara que trabalhava na mesma seção que eu só que há muito mais tempo, o cara me deu todas as dicas que eu precisava, eu salvei o couro dele várias vezes também e nossa amizade é uma relação um tanto estranha para as pessoas de fora de nosso pequeno círculo - Não perdoamos nem mesmo um ao outro, sacanagem pura.
Jake é de Hamilton (três horas de carro de Auckland) nunca deixou o país, nunca deixou a região de Auckland e por isso mesmo recebeu o apelido de "Redneck" (caipira) de mim, come o que é possível durante as horas de trabalho pois nunca tem grana para fazer o supermercado (nem que quisesse) e aliás só entra em um para comprar bebida. O resto do salário é usado para comprar maconha ou qualquer outra merda que caia em suas mãos.
Filho de mãe solteira (o pai é mais ou menos como ele, vive em Auckland mas ele sequer sabe o número do telefone - visto que o pai é um duro ele não vê nenhuma razão para ligar para o cara) e desde os dezesseis anos mora de lugar em lugar com as piores corjas de pessoas possíveis, começou sua carreira criminal bem cedo - com várias passagens pela polícia por delitos menores (pequenos roubos, posse de substãncias ilegais, dirigir bêbado e ser pego duas vezes) acabou por pedir transferência para Auckland onde sua ficha não era conhecida pelos vizinhos.
Longe de ser um cara mau - tem um coração de ouro, dentro de seus limites ele ajuda se você precisar, dinheiro para fiança as três da manhã ? Ele estará lá, uma garrafa de vinho surrupiada da geladeira da cozinha ? Ele trará gelada.
Faz piadas sobre o Brasil, insinua que minha família mora numa Oca, que nos comunicamos através de tambores e que as pessoas so sexo feminino na minha família fazem sexo com caminhoneiros por alguns trocados, acha que a Espanha fica na américa latina, não faz idéia do que se passa no restante do mundo pois não lê, ainda não entende por que estou na NZ quando poderia estar morando de graça no Brasil (e porque trabalho ao invés de explorar minha família).
Há alguns meses atrás, o imbecil enfiou o carro em uma árvore a caminho da casa aonde estava acampado (da família de um amigo, sem pagar aluguel) completamente bêbado, apareceu dois dias depois ao trabalho sem carro e sem condições alguma de continuar morando lá e trabalhar na cidade (não tem ônibus). Ficou algumas semanas na minha casa de graça - foi bem na época que o Clayton e a Lorena chegaram aqui, quando mostrei a casa para eles tive mais ou menos que falar para eles ignorarem o neo-zelandês sentado no sofá tomando cerveja e assistindo TV. Eles foram legais e não ligaram de te-lo aqui por mais uma semana e meia até ele se tocar e se mandar daqui percebendo que a coisa estava meio apertada.
Ele aparece de vez em quando, senta no meu sofá (ele agora mora em um apartamento no centro mas prefere o meu pela TV grande, DVD e internet) sempre carregando uma caixa de cerveja e de vez em quando eu decido alimenta-lo, assistimos TV, conversamos na medida do possível e quando estou cansado e quero dormir eu chuto ele pra fora.
Por alguma estranha razão, eu não ligo de emprestar dinheiro pra ele, que ele acabe com meus cigarros, que ele fique sentado na minha sala enquanto digito para o blog - ele tem apenas 20 anos e ficou meio que um irmão mais novo, como digo, ele é um adorável saco de merda.
Ele agora trabalha em outro departamento da Sky e não nos vemos muito.
E este, é meu prezado amigo, associado e cúmplice.

Adorável vagabundo.

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