sexta-feira, novembro 24, 2006

E vem os Girassóis...


Como bom cidadão paulistano, nos dias ensolarados eu ando dependurado na janela de meu carro pela megalópole (exceto pelo fato de eu não ser paulistano, claro) e no meu caminho de volta para casa passo pela Cerro Corá e outra avenida que não sei o nome.
Bem em frente da Ponteio Churrascaria da Lapa tem uma figura de uma mulher com uma cesta de vime, panfletos e uns Girassóis balançando ao vento enquanto aborda os motoristas dos carros, até aí, sem surpresa pois tem todo tipo de gente oferecendo todo tipo de coisas no trânsito de Sampa - desde guarda-chuvas passando por carregadores de celular e culminando no meu preferido : Mentex (aliás, cadê os Mentex ?).
Enfim, a figura fica paradinha encostada em uma árvore esperando a presa, desavisada, parar no semáforo trifásico que demora horrores, para poder chatear à vontade os pobres cidadãos. Chegou a minha vez : ela simplesmente não tem noção de espaço interpessoal ou privacidade - enfia a cabeça e os Girassóis dentro do carro e começa a balbuciar coisas sobre a Natureza começando sempre com "Você sabia que..." e oferece sementes em troca de um trocado qualquer para uma fundação dessas aí, mas sempre falando compulsivamente. Difícil é entender como ela consegue segurar a cesta, um panfleto enorme e ainda sim pegar o dinheiro ao mesmo tempo. Dei a merda de um trocado para me ver livre dela. Dia após dia, passava por lá e ela estava à espreita, apesar de me abordar com as mesmas frases catch a desgraçada nunca lembrava de mim e pelo fato de passar todo santo dia por aquele cruzamento eu saquei que a tal instituição do caramba não passa de caô puro, aquele era o emprego dela e pronto.
Até que um dia, exausto do trabalho e de saco cheio, estava eu ouvindo minha musiquinha e pensando na vida quando a infeliz enfia a cara dentro do carro (Girassóis inclusos) e começa "VOCÊ SABIA QUE AS PLANTAS..." eu dei um pulo e quase me agarrei ao banco do passageiro e mesmo assim, a louca desvairada continuou o rap dela sem nem se importar com o meu desconforto. Gritei de volta "E VOCÊ SABIA QUE... ...VOCÊ PODE MATAR ALGUÈM DO CORAÇÂO ASSIM ???" ainda assim, a idiota não parou de falar o script, quis matar.
Nos dias seguintes, antes de chegar ao semáforo, eu já começava a me sentir incomodado, avistava a FDP de longe e tinha que me enfiar na fila de carros mais longa, fechar os vidros e aumentar o volume do som no máximo e até fingir que estava no celular não adiantou - ela simplesmente não se tocava, nem lembra de você, mesmo dando um cheque de R$ 5000,00 hoje, ela vai enfiar a cara no seu carro como um camelo do Simba Safári e te pedir um real amanhã.
Até a fatídica tarde, em que estava chegando ao cruzamento e percebi que não havia carros suficientes para me esconder - ela saiu feito uma alucinada em direção ao primeiro carro que ela encontrou, eu ali, suando e olhando para as luzes, quando enfim o carro da frente conseguiu se livrar dela que agora olhava diretamente para mim e caminhando (tentei evitar contato visual) ela vinha, eu olhava para ela, olhava para as luzes, olhava para ela se aproximando em slow motion, luzes... ...a um metro da janela do carro, VERDE !!
Ela parou (na verdade parecia mais uma freada) eu olhei nos olhos dela e gritei "RÁ" e acelerei fundo com a satisfação infantil de vê-la estarrecida pelo retrovisor.
Depois disso, ela sumiu, fazem mais de duas semanas que ela deixou o posto dela vago para uma vendedora de cofrinhos de porquinho.

Todos tem que ter um inimigo, um nêmesis.

O meu, é a mulher dos Girassóis.

Um comentário:

Anônimo disse...

Continuas o mesmo...
Mas, aqui vai um elogio à sua forma de escrever.
Rápido, objetivo, e , sem repetição de frase.
Parabéns! Já está na hora de pensar em um livro de crônicas.

 
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