terça-feira, março 03, 2009

Enfim, estamos lá.

Bem, estamos abertos à todo vapor.

Estar em um restaurante com total cobertura da mídia, diga-se de passagem não é a melhor coisa do mundo, pois se não podemos agradar à todos quem dirá agradar especificamente um crítico - tarefa difícil e delicada hoje em dia, em um mundo de emulsões, espumas e nitrogênio, um mundo pós Adriá, pos-Alex Atala, sim um mundo que conheceu o edge culinário e agora não pode voltar atrás. Deve ser tudo muito complicado, pois quem espera o D.O.M., deve ir ao DOM, e não outra coisa.
Mas não deixemos nos abater, trabalho é trabalho e trabalho deve ser parte de sua vida, não a vida em si eu digo, meu trabalho não define quem sou e quem sou muito menos define meu trabalho (ainda) o que é uma pena pois adoraria imprimir minha transloucada personalidade em um cardápio, sabe-se lá o que iria dar, Asiático com Adriático, Mediterrâneo com Brasileiro, uma mistura louca que talvez revelasse um pouco do que vi e senti, talvez eu devesse ser um cozinheiro mais livre, talvez o mundo não mereça (e não queira) o que talvez poria è mesa mas se Deus sabe o que faz, não deixou ainda eu ter meu cardápio por uma boa razão. Respeito isso. AS vezes ele faz assim comigo, as vezes até não gosta de mim por capricho meu.

A vida sim, mudou bastante, vejo pouco meus amigos e família e o tempo livre que gasto é comigo mesmo a maior parte do tempo, lavar, passar domas e aventais, limpar a casa, quase causar um incêndio depois de um turno quase ininterrupto de dois dias (e conviver com o cheiro de queimado) são a minha vida agora. Pelo menos tenho as madrugadas e Deus sabe como eu adoro a madrugada, fico mais ligado, mais criativo, mais tudo pela madrugada. Odeio dormir, se pudesse, não dormiria jamais.

Penso que o peso que tenho co meus amigos diminuiu até porque, geralmente eu não estou lá - a criança deu os primeiros passos, caiu de cabeça e soltou um pum em seguida e eu não estava, o churrasco incrível à beira da piscina, as fofocas, as pessoas e o caramba e eu não estava lá. Simples assim. Não esperam que eu esteja lá e na verdade, quando estou isso faz tudo bem mais colorido apesar de que quando estou lá, estou cansado. O cachorro alcança o carro e quando ele pára, não sabe o que fazer com ele. Sou um cachorro cansado.

Bem, ainda testo meus limites à estupidez humana (que parece não ter fim), penso que pessoas deveriam ser castradas para não procriar e ainda assumo inteiramente que gente em geral faz nada mais que foder a vida alheia - somos escravos da desgraça alheia (veja todas as revistas de fofoca em circulação e quais as machetes que vendem mais, boas ou ruins ?)mas talvez existam boas almas e o Gustavo ainda tenta me convencer que a humanidade tem solução ou talvez a vida seja bela. Hmmm.. Não.

Bem, somos macacos batendo com ossos em uma caixa sem saber abri-la.
Basicamente, ainda, é isso, causamos guerras sem sentido, discriminamos, matamos, refugiamos e estamos mais para a auto-preservação do que a tal da solidariedade, aquela, que deveria ser mais do que discar um número de doação e menos que dar um trocado à alguém que pode riscar seu carro caso desagradado (sou consciente, mas se alguém tocar meu carro eu mato). Se eu tenho esperança ? Não muita.

Mas trabalhar em um restaurante é ter a paisagem humana exposta à sua frente, isso não dá para negar - temos tudo ali, os trabalhadores, os patrões, a clientela (que tem pena de saber que você trabalha fins de semana mas que é impiedosa se alguma coisa chega mais passada do que deveria), as relações, as intrigas, os territórios, tudo está ali desdobrado pelos seres mais egocêntricos e territoriais do mundo que somos nós, chefs. Ahhh.. eu adoro a falta de sutileza deste trabalho.

Gritamos, falamos, interrogamos e detestamos receber ordens apesar disto ser a base de tudo que fazemos, obedecer ordens... ...um paradoxo delicioso, sempre nos achamos melhores que as pessoas que nos comandam, mesmo errados (e puxa, como estamos) escolhemos quem vamos respeitar e ainda assim, somos (em geral) leais mesmo àqueles que nos mandam, não existem muitos empregos assim. Se a humanidade fosse uma cozinha, existiriam guerras sim, mas acho que elas seriam travadas até o último homem de ambas as partes ou talvez, ninguém aparecesse por saber que não teria uma finalidade prática. Travamos guerras para que as pessoas tenham prazer, trabalhamos na indústria do prazer, somos soldados do prazer.

Eu simplesmente continuo me perguntando porque fazer isso, porque sacrificar tanta coisa para que as pessoas tenham momentos de prazer enquanto eu sofro.

Talvez seja isso que os soldados pensem durante uma guerra - mas ninguém morre de cozinhar...

Um comentário:

Anônimo disse...

Parabéns pelo texto Rick, muito bom ! "Todos dizem o quanto violentas são as águas de um rio, mas nunca dizem violentas às margens que o comprimem" ! Sucesso aí na sua labuta diária ! Abraço

 
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